Atualmente somos dragados pela rapidez das informações, pela demanda de produzir, fazer e estar constantemente atualizados e informados sobre tudo. Nossa rotina se tornou robotizada. Nossas palavras, cada vez mais vazias de emoção. Nossos sentimentos, afetos e dores tamponados pelas tarefas do dia-a-dia, que devem a todo custo serem realizadas com ultra perfeição e ao máximo de nossa performance.
Em que se transformou o verdadeiro ato de se relacionar? Para onde foi a paciência e a disponibilidade real de ouvir o outro?
Um diálogo interessado com uma pessoa onde haja reciprocidade torna-se cada vez mais escasso. Quando foi a última vez que você conversou com alguém e que ao invés de competição nas entrelinhas - disputa pelo título do melhor argumento - houveram sincronicidade e olho no olho? Muito é admirado o dom da palavra daqueles que são bem articulados, cultos comunicadores inatos que não se perdem nem em seus pensamentos nem em suas palavras quando discursam. Porém muitos esquecem que ouvir também é uma arte.
Ouvir não significa apenas escutar ou simplesmente estar de corpo presente no momento em que o outro fala. Saber ouvir significa considerar, significa por um momento apenas tentar sair de sua própria pele a fim de procurar sentir o que o outro sente e deseja comunicar, e assim tentar abraçar sem julgamentos a experiência ou angústia alheia.
Por que casos de depressão em todas as faixas etárias e pessoas cada vez mais solitárias estão cada vez mais crescentes? Por que as taxas de suicídio e divórcio aumentam sem controle?
Pense naquela pessoa que você ama, naquele amigo que você tanto gosta, você realmente o ouve? Notamos muitas vezes um sinal de tristeza ou preocupação marcando o rosto destas pessoas de nosso convívio mais próximo, mas estamos realmente dispostos a ouvir o que o outro tem a falar de sua dor? Por que sempre arranjamos tempo para criticar e julgar mas não para ouvir? Para ajudar quem ama, nem sempre é necessário ter o melhor repertório de palavras e interpretações acerca do problema exposto pelo outro, muitas vezes basta ouvir com carinho, simplesmente compreender. Às vezes uma simples tentativa de compreensão, expressa o companheirismo e o acalento que quem sofre tanto precisa.
Quem nunca teve aquela sensação de estar tentando explicar algo para alguém e esta pessoa o interrompe justo no meio do fluxo de suas emoções e pensamentos com enxurradas de suas próprias opiniões que não fazem o menor sentido com a sua temática? Esse comportamento além de não ajudar, atrapalha, obrigando o sujeito engolir o restante de sua frase e conseqüentemente seus sentimentos que estavam prontinhos para serem postos para fora e trabalhados. Tão ruim quanto engolir de volta o que estava prestes a sair, é ter de digerir tudo novamente, desta vez se sentindo mais sozinho. Quem já não ouviu de alguém (ou quem já não disse!) um sonoro: "sim sim, já até sei o que você vai falar...eu te conheço!" Esse tipo de frase carrega o significado da desistência do outro, retira a possibilidade do outro em transformar-se em algo novo e evoluir, não deixando espaço para mudança e novas expressões do vir-a-ser. Ao mesmo tempo que o silêncio assusta e é incomodo para muitos, nos esquivamos muitas vezes de nos comunicar não só por temer o conflito, mas também porque raramente sentimos que há alguém de fato disposto a nos ouvir. Relacionamentos terminam e pessoas se afastam pois não há escuta ou acolhimento mútuos, mas sim sucessivas críticas e emolduramentos do outro em moldes extremamente estreitos que são quase sempre correspondentes as próprias limitações psíquicas de quem o faz.
Este atropelamento nas palavras caracterizando a falta de disponibilidade de ouvir, engessa o outro em um lugar onde ele talvez não mais pertença, o outro se decepciona e não se sentindo acolhido e compreendido, se afasta. A ação de exercitar uma escuta saudável que proponho aqui no dia-a-dia entre membros familiares e amigos ou pessoas próximas, é algo que não é terapia caseira mas que pode exercer um efeito terapêutico benéfico em quem num dado momento de sua vida precisa ser envolvido em uma rede de proteção e ajuda, afinal todos nós em alguma circunstância já nos vimos em momentos de vulnerabilidade e confusão.
Os benefícios do exercício da escuta são evidentes, estes são a melhoria das relações em geral reduzindo mal-entendidos na comunicação, pois apenas através da escuta apurada é que conseguimos enxergar a real perspectiva do outro e conseqüentemente nos colocarmos de maneira mais apropriada e justa na situação em questão; mas não há como colher bons frutos numa horta onde não houve uma boa semeadura, isto é, a escuta é um exercício que deve ser praticado. O orgulho, outro fator que atrapalha a escuta, lança o outro sempre no patamar do defeituoso, impróprio, complexado, afinal de contas o sujeito orgulhoso se sente infalível, se comportando como um tanque blindado que sem tato passa por cima de tudo e de todos. Para este indivíduo que protege suas inseguranças com este escudo chamado orgulho, ter de escutar é como uma tortura, pois escutar significa trocar, conceder, relevar, aprender algo novo e se doar.
É sinal de fortaleza aquele que expõe suas fraquezas e sabe pedir ajuda, covarde é o que banaliza, critica ou reprime a tentativa do outro em se aproximar. Quando nos doamos para ouvir verdadeiramente o outro estamos contribuindo para diminuir o descrédito alheio, a distância entre as pessoas e a desconfiança tão impregnada em nossa sociedade traumatizada por guerras, violências e o individualismo cada vez mais extremado. Quando ouvimos o outro não estamos perdendo, muito pelo contrário, estamos ganhando experiências e sabedoria, quem ouve mais aprende mais e muito! Ao ouvir aprendemos a nos relacionar com saúde e assim praticamos algo que de fato nos trará felicidade: o prazer da troca, da generosidade e de fazer o bem. Quando foi a última vez que você, de verdade, ouviu alguém? "Eu não procuro saber as respostas, procuro compreender as perguntas." Confúcio ou Kung-Fu-Tze - Filósofo Chinês
Autora: Andreia Hollenstein
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