Excitação, paixão e emoção que aquele primeiro vislumbrar que novas perspectivas oferecem, porém o que acontece com os sentimentos após esta fase mágica?
Normalmente o processo de adaptação em uma cultura diferente a nossa pode ser visto como um “U”, a primeira ponta de cima é a euforia do novo que depois vai descendo chegando à curvinha lá embaixo, esta representaria os momentos de dúvidas, desilusão, solidão e até de desistência, subindo novamente para a outra ponta que já seria a fase mais estável da adaptação, onde já conseguimos nos reconhecer no estranho e a caminhar sozinho. Gostaria de chamar aqui a atenção para a questão profissional da mulher que migra e do quanto ter uma carreira profissional se torna importante para sua autonomia, identidade e bem-estar onde quer que ela esteja. Em nossa sociedade nos definimos não apenas mas em grande parte através de nossa profissão, esta além de nos localizar e nos identificar socialmente, ela nos trás um sentimento de estar no mundo contribuindo com algo para alguém e principalmente de estar pleno, se ocupando e se completando ao exercer a atividade escolhida. Nosso trabalho e a responsabilidade que tomamos por este, trás também o desejo de melhorar-se, fazer bem, aprender mais e conseqüentemente expandir e evoluir como pessoa. A mulher que migra está por uma série de motivos mais sujeita ao afastamento de sua vida profissional, o tempo que se leva para ter fluência na língua estrangeira, não reconhecimento de diplomas no exterior e muitas vezes até a falta de apoio do companheiro, chegando até a uma sutil coibição, são apenas algumas razões que acabam minando com sua auto-confiança e fazendo com que a mulher adie para uma data que esta não conhece o começo ou o recomeço de sua carreira no exterior. Se olharmos para o passado podemos ver que a cultura brasileira sempre ensinou que a mulher tinha de obedecer e a sacrificar-se pelo outro. Colocada sempre em último plano, podemos ver isso no curso da história brasileira, um exemplo é a instituição do voto feminino que no Brasil chegou décadas mais tarde do que no resto mundo, assim como seu acesso à universidades e por conseguinte sua emancipação. Sem contar que o papel da mulher no Brasil colônia era restrito à organização da casa e à procriação, a mulher apropriada era a que possuía atributos como ingenuidade, pureza e subordinação, esta era vista como um objeto para o sexo, porém sem sexualidade. Sem querer e devido à certas circunstâncias difíceis que podem ser apenas momentâneas, nós mulheres acabamos reproduzindo alguns resquícios de nossa história, nos colocando em um lugar que não nos cabe a muito tempo. Subjugar-se em todos os graus e roupagens não é saudável, ao contrário, é um corte da criatividade, talentos e da essência do feminino e do humano, devemos nos mostrar sem medo inteiramente quem somos, como mulher assim como pessoa possuidora de sonhos, ânsias, medos, dúvidas, fortalezas e fraquezas. Ter clareza do que realmente se quer fazer e persistir em seus propósitos individuais funciona como um ótimo guia para não se submeter a tristes situações que na verdade em muitos casos não é necessário que se submeta. O exercício da auto-reflexão e de auto-questionamentos propicia o direcionamento do olhar para nós mesmos, para investigar o que desejamos e o que nos faz genuinamente feliz para então trilhar o caminho com mais confiança e menos desvios e distrações, nunca abrindo mão de quem realmente somos e do que somos capazes. "Como mulher eu não possuo país. Como mulher, meu país é o mundo todo."
Virgínia Wolf
Autora:
Psicóloga Andréia de Miranda Hollenstein
CRP: 05/36484
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